Alagoas registra mais de 6.800 casos diagnosticados de Aids em 32 anos

Dezembro Vermelho, o mês de luta contra o vírus HIV, a Aids e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) trouxe à tona a importância de continuar sensibilizando a população para a prevenção e o tratamento precoce. Em 32 anos, de janeiro de 1986 até novembro deste ano, foram registrados 6.848 casos da doença em Alagoas, segundo dados do Sistema Informação de Agravos de Notificação (Sinan).

Do total de diagnosticados com a síndrome, 4.538 são homens e 2.310 mulheres. A maior concentração dos casos da doença está nos indivíduos com idade entre 30 a 39 anos, o que corresponde 2.405 pessoas. A faixa etária entre 20 a 29 anos vem em segundo lugar, com 1.788 pessoas com diagnóstico confirmado, sendo 1.149 no sexo masculino e 639 no feminino. O grupo de pacientes entre 40 a 49 anos vem em terceiro lugar, com 1.550 indivíduos. Já os casos de Aids notificados entre 1986 a novembro de 2018 em menores de cinco anos, foram 117, enquanto na faixa etária entre 5 a 14 anos, foram 61.

O boletim epidemiológico também destaca que, entre 1986 a novembro de 2018, 2.217 óbitos foram causados por Aids no Estado. Em relação à faixa etária, o maior risco foi identificado nos indivíduos com idade que vai de 30 a 39 anos, com 448 casos. Em seguida está a faixa de 40 a 49, com 382 pessoas que foram acometidas pela síndrome.

Em poucos meses

De janeiro a novembro deste ano foram informados no Sinan um total de 336 casos de Aids em Alagoas. No mesmo período do ano passado, foram registrados 399 casos na população geral. No intervalo de onze meses, a maior concentração dos casos da doença está nos indivíduos com idade entre 30 a 39 anos, o que corresponde a 104 pessoas. A faixa etária entre 40 a 49 anos vem em segundo lugar, com 86 pessoas com diagnóstico confirmado. O grupo de pacientes entre 20 a 29 anos vem em terceiro, com 65 indivíduos. Já os casos de Aids notificados em menores de dez anos foram apenas dois, enquanto na faixa etária entre 50 a 59 anos foram 43.

No que se refere à análise de casos de Aids por sexo, identificou-se um total de 231 ocorrências em homens e 105 em mulheres. Ao analisar a distribuição proporcional dos casos de Aids segundo raça e cor, observou-se um predomínio de pardos autodeclarados, os quais 241 representam o total de casos, 32 de cor branca, 24 preta e 39 não quiseram falar sobre sua etnia.

Quanto à categoria de exposição, verificou-se o predomínio dos heterossexuais (151), seguido do público homossexual (57), bissexual (13), perinatal (5) e usuários de drogas injetáveis (2). Há ainda, entre os portadores da doença, 108 que não quiseram declarar sua orientação sexual.

HIV

No período de janeiro até novembro deste ano, foram notificados no Sinan, 775 casos de infecção pelo HIV em Alagoas, sendo 498 em homens e 277 em mulheres, contra 773 em 2017. No que se refere às faixas etárias, observou-se que a maioria dos casos acomete o público de 20 a 29 anos, com 287 pessoas com diagnóstico confirmado.

Com relação à raça/cor da pele autodeclarada, observou-se que, entre os principais casos registrados no Sinan, no período de janeiro a novembro deste ano, 529 são pardos, 87 brancos, 60 pretos, dois amarelos e cinco indígenas. Ressalta-se o alto número de casos com a informação sobre raça e cor ignorada: em torno de 92. Na categoria de exposição, no mesmo período observado, verifica-se que 346 dos casos foram decorrentes de exposição heterossexual, 175 homossexual, 64 bissexual, 23 por perinatal, um se deu entre usuários de drogas injetáveis (UDI) e 166 foram preenchidos como ignorados.

Ações

Com a implantação dos testes rápidos para o diagnóstico da infecção pelo HIV, por meio do Projeto Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) Itinerante, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) conseguiu atender, de abril a novembro deste ano, 5.267 pessoas. Desse total, 31 receberam a confirmação de soropositividade.

De acordo com Sandra Gomes, coordenadora do Programa de Combate às IST/Aids e Hepatites Virais da Sesau, os CTA têm representado uma estratégia importante na promoção de acesso da população alagoana ao aconselhamento e ao diagnóstico das IST, sobretudo em relação ao HIV. “Como os CTA funcionam exclusivamente para esse diagnóstico, tanto do HIV, quanto da sífilis e hepatites B e C, ele acaba sendo uma porta de entrada para a população mais vulnerável, a exemplo dos HSH [homens que fazem sexo com homens], travestis, transexuais e profissionais do sexo”, disse Sandra Gomes.

Janela Imunológica

A coordenadora do Programa de Combate às IST/Aids e Hepatites Virais da Sesau explicou que a janela imunológica é o intervalo de tempo decorrido entre a infecção pelo vírus até a primeira detecção de anticorpos anti-HIV, produzidos pelo sistema de defesa do organismo. Na maioria dos casos, a duração da janela imunológica é de 30 dias. Porém, esse período pode variar, dependendo da reação do organismo do indivíduo frente à infecção e do tipo do teste – método utilizado e sensibilidade.

“Se um teste para detecção de anticorpos anti-HIV é realizado durante o período da janela imunológica, há a possibilidade de gerar um resultado não reagente, mesmo que a pessoa esteja infectada. Dessa forma, recomenda-se que, nos casos de testes com resultados não reagentes, onde permaneça a suspeita de infecção pelo HIV, a testagem seja repetida após 30 dias, por meio da coleta de uma nova amostra”, afirmou, ao ressaltar que, “no período da janela imunológica, o vírus do HIV já pode ser transmitido, mesmo nos casos em que o resultado do teste que detecta anticorpos anti-HIV for não reagente”.

O resultado

José Antônio (nome fictício) tem 21 anos, mas aparenta ter menos de 18. À espera, num corredor de um ambulatório, para saber se o resultado do teste rápido deu negativo ou positivo, o deixava com o olhar preocupado, repleto de dúvidas, incertezas e medos. Ele não parava quieto, agitando as mãos compulsivamente, de unhas roídas. Antes de entrar no consultório, o rapaz franzino, de estatura mediana, cabelos pretos, de textura cacheada e de comprimento médio, bebeu vários copos de água em vão, na tentativa de reverter à ansiedade. Passados alguns minutos, a psicóloga o chama para adentrar na sala, cuja enorme porta de madeira se abre.

Após a consulta, que durou cerca de meia hora, José sai como se um fardo do tamanho do mundo tivesse caído em seus ombros. O diagnóstico, por sua vez, apontava a presença do HIV no seu sangue. O primeiro momento – a descoberta – era de desespero. Frio na barriga. Sensação de incômodo. Porque, embora não mais signifique sinônimo de morte, o imaginário do jovem em torno do vírus ainda era repleto de sombras. José sentia como se uma nuvem negra e pesada começasse, aos poucos, a pairar sobre sua cabeça, carregada de interrogações e reticências. “Eu vou morrer?”, “Não vou mais namorar?”, “Vou perder muito peso?”, “Como será minha vida agora?”, “Vou desistir de viver…”, “Por que eu fiz isso?”.

Ele, no entanto, já suspeitava de que poderia ter contraído o vírus HIV, pelo fato de sempre ter transado sem camisinha. “Iniciei a minha vida sexual aos 10 anos, em encontros casuais que demoravam, no máximo, duas horas. Geralmente os homens que eu conhecia estavam na noite”, disse, acariciando os cachos que caíam em cascata, “pois nunca transei com preservativo, mesmo sabendo que eu poderia contrair o vírus a qualquer momento”.

Aquele imediatismo dos relacionamentos, onde muitas pessoas querem viver a vida intensamente – aproveitando cada dia como se fosse o último de suas vidas – e devido a isso, as etapas acabam sendo invertidas: primeiro se amam e, depois, se conhecem. “A sensação de ter descoberto ser soropositivo é, pra mim, de raiva e angústia. Mas vou continuar vivendo, não é?”, respondeu, em tom baixo, à sua própria interrogação, segurando o resultado do exame. Hoje, porém, com o diagnóstico de soropositividade para HIV, José acredita que vai ficar muito mais difícil o relacionamento com outros homens, uma vez que “a única coisa que as pessoas sabem sobre o HIV e a Aids é nos botar medo”.

Por meio do recurso terapêutico, contudo, o jovem vai conseguir com que o vírus fique sob controle. “Estou disposto a encarar o tratamento, mesmo sabendo que vão existir os efeitos colaterais”, disse. “Quanto ao uso da camisinha, vou começar a colocar no bolso e conversar com meus futuros parceiros sobre a importância desse método preventivo, pois, daqui pra frente, é a minha saúde e de outras pessoas que está em jogo”, completou, ainda confuso com o excesso de informação que tinha acabado de receber da psicóloga.

A partir de agora, José Antônio almeja reescrever sua história. Começar por um parágrafo de cada vez e deixar sua vida fluir, página por página. A cada dia, uma nova oportunidade. “As pessoas não precisam ter medo de fazer a testagem rápida. Muitas acabam desistindo por conta do resultado. Se eu não tivesse vindo pra cá, talvez nunca soubesse que estaria com o vírus no meu corpo. Não é fácil receber um diagnóstico como esse, mas vou precisar ser bastante corajoso pra enfrentar tudo que está por vir. Afinal, é assim que a vida funciona, não é?”.



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